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  • Foto do escritorSuelen Weiss

52 - A Casa e o Lar

26/04/2021 - 580 dias - Lembro de um dia em que, conversando com meu marido, eu afirmava que é mais fácil de descrever a verdade em palavras, não em imagens. Eu exemplifiquei: se você olhar para aquele piano vai ver um móvel com objetos na parte de cima, mas eu descreveria assim "o piano encostado no canto da sala, que só toca notas sem afinação, sustenta bibelôs e lembranças das viagens feitas na vida, cada pequena réplica de catedral carregando por sua vez uma enxurrada de memórias boas".


Hoje é o primeiro dia que passo em minha própria casinha depois da remoção do Theo para São Paulo. E tudo parece utópico. Uma foto daqui seria tão pouco…. E nem todas as palavras descrevem quantas raízes minhas finquei aqui.

A corujinha, réplica do François Ponpom, tem nela toda a empolgação das viagens que fiz com o Cristiano, contém cada pincelada de cada obra de arte dos museus que visitamos.

A mesa de jantar, grande e espaçosa, já teve jantares em família, vinho e risadas. Foi ali que começamos a introdução alimentar do Theo. A cozinha toda já foi meu espaço de terapia, secava minha alma sempre que o estresse transbordava no trabalho. Tem armários cheios de quinquilharias que pareciam tão importantes.


Os quartos são pequenos, mas já não tem as goteiras que ocupavam todos os baldes e panelas da casa. Tem uma pequena banheira, um lindo berço e bichinhos de pelúcia de quem passou meses intensos aqui. Onde amamentei e cantei canções de ninar.

O sofá de onde escrevo presenciou as inúmeras horas de choro, desespero e indignação da gestação. Pra cá que eu vinha nas horas de insônia e vazio na alma. Mas também foi nesse sofá que o Cris fez as massagens de shantala antes dos banhos do Theo, onde sentavam para assistir o jornal da manhã enquanto eu dormia mais um pouco.



Hoje o jardim está repleto de folhagens marrons de penas rebeldes que dançam ao vento de outono, sem se importar com a ausência de música. Dançam ritmadas, em uma coreografia constante. Será que fogem dos mosquitos? Ou será que sou eu que não ouço a música delas? O salgueiro chorão perdeu as folhas, como toda vez que o inverno se aproxima. A natureza é cheia de ciclos, afinal.

Está tudo aqui, em pausa, como se esperasse que esse ciclo de espera pelo transplante acabe.

Esse piso que brilha na sala, meu primo que assentou. Esse forro branco e charmoso no pé-direito alto, foi meu pai que colocou.

Eu lembro como se fosse hoje da semana que passamos sem essas janelas. Do frio que fez e da sensação de obra quase pronta, da expectativa de terminar a obra.

A casa estava sim quase pronta, o lar está em constante construção. Como diz a canção, "a minha casa está onde está o meu coração".

Não vejo a hora de sair do exílio e trazer minha pequena família de volta para este lar.




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