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  • Foto do escritorSuelen Weiss

2. O Diagnóstico

Chegou a 23ª semana. Como sempre, estávamos ansiosos para ver nosso filho no ultrassom do mês, que seria o morfológico do 2º trimestre (27/06/2019). No instante que o exame começou, vi que a expressão do nosso obstetra ficou muito séria. Na tela já dava para ter uma pista do problema: praticamente não havia líquido amniótico. Eu esperava que fosse apenas um pequeno percalço, que eu precisaria de repouso ou algo assim. Mas não. Quase 1 hora depois, ele concluiu o exame, após repetir dezenas de medições e aferições, nos detalhou a situação.


O médico explicou que os dois rins do nosso filho estavam gravemente comprometidos, por uma displasia (provavelmente Doença Policística Renal Recessiva, malformação de origem genética). Por isso não havia urina. E por isso quase não havia líquido amniótico. E por isso os pulmões do nosso filho não se desenvolveriam. E por essa infeliz sequência ele provavelmente não respiraria sozinho e entraria em falência renal pouco tempo depois de nascer. O prognóstico não era preciso mas era trágico para nós: um parto prematuro de um bebê que teria pouquíssimas chances de sobreviver, mesmo na UTI neonatal. Não havia um tratamento possível/satisfatório para o quadro.


Não era só um bebê com diagnóstico fatal, era o destino do nosso filho, tão amado e esperado. Lembro de ouvir o as explicações do obstetra, que foi muito delicado em dar a notícia, mas que foi claro em não dar falsas esperanças. Cada frase que eu ouvia era como uma chicotada, me sentia diminuindo, diminuindo, diminuindo. Quase não conseguia respirar ou reagir. Sou grata por ter tido meu companheiro ao meu lado nesse momento, que imediatamente fez as perguntas necessárias, buscou referência para acompanhamento psiquiátrico e mais tarde contou para minha família o que estava acontecendo. Ao sair do consultório me percebi num enorme vazio repleto de dor. Chorei meu desespero na porta clínica pedindo para ir embora dali. Eu tive o colo do meu companheiro que me prometeu que faríamos tudo de novo, quantas vezes fossem necessárias, até ter um filho no nosso colo.


Abro parênteses aqui para falar sobre coisas importantes, porque é muito fácil nos julgar e são muitos os aspectos que precisam ser considerados. Nessa situação, obviamente havia a vida do nosso filho precioso, mas estava em jogo também minha maternidade, a paternidade do meu marido, nosso casamento e relacionamento, nossas expectativas, nossos planos, entre outros.



Ao dizer que faríamos tudo novamente e buscaríamos uma nova gravidez não estávamos desprezando a situação de nosso filho, mas sim acalentando nossa maternidade e paternidade. Isso fez muita diferença, pois nenhuma loja de roupinha de bebê nem a decoração do quartinho me trouxe ressentimento. Só senti o desejo de ser mãe crescer ainda mais.

Sem chão e sem consolo, repetimos o exame mais duas vezes e buscamos mais três opiniões médicas diferentes em uma semana. Um ultrassom no dia seguinte, dessa vez super preciso… o super prestigiado médico não olhou no meu rosto inchado de tanto chorar, foi evasivo quanto ao prognóstico, pontuou consequências possíveis da sequência de Potter, fenótipo e características físicas marcantes, conversou praticamente só com meu marido, era como se eu não estivesse lá. Mais um ultrassom, dessa vez com nosso obstetra e com o chefe da ultrassonografia de maternidade pública… confirma a displasia com mais empatia e um conselho: levem adiante e vejam o que vai dar para não ficar na dúvida daqui a 5 anos. Terceira consulta, mais resignados, ouvimos sobre a abordagem do tratamento no Brasil e no exterior, bem como sobre a letalidade quase certa e média de sobrevida dos demais. O diagnóstico foi praticamente unânime. Nessa semana definimos seu nome: Theo.


No Brasil as possibilidades de interrupção de uma gravidez com feto inviável são bem restritas. Não poderia ser diferente num país laico onde as lei são feitas sob a batuta de bancadas evangélicas e os processos julgados majoritariamente por pessoas que não passam pelo processo de gestar e parir, os homens. O prognóstico do Theo era de um bebê que nasceria prematuro e que morreria no parto ou por não conseguir respirar ou por falência renal/hepática, em poucos dias. Mas a interrupção da gravidez não era legalmente possível e por isso teríamos que esperar até que ele completasse 28 semanas de gestação para o parto.

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